Ideias à solta
- Francisco Gs Simões
- 25 de abr. de 2019
- 2 min de leitura
Li um texto da Anabela Mota Ribeiro. Lê-la é um regozijo para mim.
Naquele texto, exorta o Plano Nacional de Leitura, o Ensino Público e a evolução ocorrida desde o tempos dos nossos avós.
A alfabetização alterou radicalmente os projetos de vida dos cidadãos comuns. Saber ler, escrever e contar abriu uma porta, outrora fechada, para um novo mundo de oportunidades, vedadas aos analfabetos.
Os meus avós seriam, hoje, considerados analfabetos.
Desconheciam, ainda na circunstância agora póstuma das suas existências, a utilização dos telemóveis ou computadores. Não se demoravam em leituras e não se atreviam em equações complicadas. Para eles, enfrentar o ensino primário permitiu-lhes empreender os seus próprios negócios e fazer vida com eles.
As suas competências, eram limitadas, à luz do que hoje consideramos básico.
Questiono, contudo, o que consideramos nós, atualmente, analfabetismo?
Portugal ainda tem meio milhão de analfabetos e 25% de pessoas que nunca acederam à internet. Na era da transformação digital, ainda há em Portugal meio milhão de pessoas que não sabem ler nem escrever.
Falamos de adultos, pessoas da nossa idade, que não conseguem ir às compras sozinhos, nem usar o multibanco.
Falamos de jovens em idade escolar que julgam dominar as redes sociais, mas não sabem interpretar um texto nem escrever um parágrafo. Jovens que frequentaram o ensino obrigatório, sem adquirirem as competências mínimas. Que dificilmente conseguirão concorrer a um emprego em igualdade com outros jovens com as mesmas qualificações, embora sem competências de facto. O futuro da nossa sociedade, enredado nos meandros do Rendimento Social de Inserção e dos restantes apoios públicos, em jeito de sobrevivência. Mas que orgulhosamente exibem os seus telemóveis topo de gama, ininterruptamente ligados à grande rede social que os faz sentirem-se vivos.
Digo-o sem radicalismos.
Analfabetismo não é, sobremenos, apenas não ter competências de leitura, escrita e cálculo.
É não saber situar-se, compreender o mundo, compreender-se a si mesmo. É achar-se mais do que os outros, por arrogância disfarçada de insegurança, ou menos do que os outros, simplesmente por não saber.
É não conhecer a sua história, desrespeitar as histórias dos outros e, vezes demais, sempre vezes demais, reagir com violência à diferença.
E existe demasiada violência por analfabetismo básico.
É urgente que este ciclo seja quebrado, que estes jovens sejam capacitados para o exercício pleno dos seus direitos e obrigações de cidadãos.
É urgente responsabilizar todos os agentes envolvidos no cenário do percurso académico dos futuros cidadãos, daqueles que erguerão as nossas bandeiras, para que saibam e possam gritar os nossos valores.
Mais, é urgente pensar o futuro - grande parte da população ativa pode, num ápice, tornar-se analfabeta tecnológica e culturalmente. Já em 1996 Jean-Pierre Vélis afirmou que podemos hoje ter uma vida social, profissional, familiar inteiramente feliz e ser apanhados amanhã por um ‘iletrismo’ que ainda não existe.
O que seremos nós, se chegarmos à idade dos nossos avós?
É assustador?
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