Crónicas ao Sábado
- Francisco Gs Simões
- 16 de mar. de 2019
- 2 min de leitura
O crime de ódio está em constante divulgação por parte dos media. E não é por acaso – os casos do Brasil e da Nova Zelândia relembra-nos que ninguém está imune e não temos apenas a ameaça do Daesh como última equação nesta equação demasiado complicada.
Os crimes de ódio criam-me, pessoalmente, alguns entraves à compreensão do outro e em última análise, é por aí que começam os grandes desentendimentos – a falta de empatia pelo outro, a falta de compromisso pelo outro, a falta de valor que uma vida tem. Porque a nossa é a mais importante. A nossa vida, os nossos amigos, as nossas convicções, as nossas grandiosidades e em última análise, o nosso próprio lixo.
Tudo assume uma posição mais importante, quando é nosso. O sentimento de possessão que temos em relação às coisas e em última análise às pessoas. Na última semana morreu mais uma mulher vítima de violência doméstica. Porque as mulheres muitas das vezes são encaradas como mais um objecto, algo que nos pertence. Algo que não fala sem a nossa influência e cujo direito é obrigar-se a cumprir as ordens.
O ódio é algo bastante difícil de aceitar. Tomemos por exemplo o caso do Rwanda. Em 6 de Abril de 1994, Habyarimana e Cyprien Ntaryamira, o presidente do Burundi, foram assassinados quando o seu avião foi atingido por fogo quando aterrava em Kigali. Durante os três meses seguintes, os militares e milicianos mataram cerca de 800 000 tutsis e hutus, naquilo que ficou conhecido como o Genocídio do Ruanda. Vizinhos assassinaram vizinhos, apenas porque nasceram numa família diferente. Do dia para a noite, tudo mudou. Não houve mais sorrisos, não houve mais abraços. O que era outrora um amigo, passou a ser encarado como uma ameaça e o mundo ficou a ver. Como agora fica perante os casos do Iémen e da Venezuela. Ninguém se importa verdadeiramente se não cair à nossa porta, se não tocarem naquilo que é nosso e possamos continuar a ver um reality-show da sic, a qualquer domingo, enquanto comemos os restos que a sogra nos deixou.
O que é que resulta daqui? Resulta que num mundo cada vez mais unido pela globalização, importa que entendamos que o outro, faz parte de nós próprios. Que alguém que passa fome no Equador, nos afecta diretamente ao dia de hoje. Que a mudança começa sempre no seio da nossa mesa: sem distinção daquilo que é política de esquerda ou de direita (vamos ser sinceros, isso é muito anos noventa) e que por muito que seja contra as nossas fundações, a opinião do outro conta. Tem de contar, mesmo que vá contra aquilo que representamos, importa tentarmos compreender o outro e perdermos o nosso tempo a explicar várias razões. Por muito que nos custe. Este não é um texto com uma fórmula mágica, mas talvez tudo pudesse ser mais simples se nos importássemos em construir o outro, compreender o outro, respeitarmos o outro, afastando o ódio daquilo que interessa. Pelo nosso bem, mas também pelos nossos filhos e sobrinhos que ficarão por cá. Ninguém está imune e estarmos juntos, importa mais do que nunca.
Luís Miguel da Silva
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